Quarta feira:
O navio estava previsto para chegar às 8h no APM Terminals Newark, mas felizmente às 6 da manhã o oficial de serviço me liga para a atracação. Coloco o meu macacão, os sapatos de segurança, capacete e luvas. Quando chego no convés, o céu ainda estava escuro e o sol levantava preguiçosamente no horizonte. O navio tinha acabado de passar por uma das centenas de pontes do Rio Hudson, quando senti uma vibração intensa – O Comandante acabara de ligar o “Stern thruster”, ou impelidor de popa. Serve para propulsionar o navio para os lados, muito útil durante atracação/desatracação.
Passei a noite inteira do dia anterior maquinando e planejando o que fazer durante o dia: “Bem, se o Imediato me liberar às 8h, posso fazer isso, aquilo. Caso ele me libere às 9h, bem, só poderei fazer isso. Ah, ele não vai me liberar depois do meio dia, ele vai desembarcar nesse porto! Não é possível que ele seja tão mau assim.” – Mas é.
Quando eu acabo de tirar a densidade da água do rio – 1,016kg/l – o 2° Oficial me diz: “Wei, o Imediato disse que você só poderia sair após ajudar o pessoal com as provisões que estão para chegar.” Essa frase veio como um tiro no meu peito. Tudo que poderia pensar naquele momento era: “@#%& *@# #%*#%!!!!!!!” (E em letras maiúsculas, muito maiúsculas!) Acabou com os meus planos. E agora, José?
Fiquei perambulando pelo convés, sem muito que fazer. Um grupo de policiais do “Department of Customs & Homeland Security” vieram a bordo fazer inspeções a fim de encontrar drogas e/ou imigrantes ilegais escondidos. Vasculharam o navio, estouraram um container refrigerado, colocaram um cão farejador dentro do container (coitado do animal, estava fazendo um frio de -18°C), mas não encontraram nada. Inclusive tive que levar dois deles até a sala do impelidor de proa (Bow thruster room), descendo 5 andares do convés principal. Eles entraram em cada buraco que eu nunca nem sonharia em entrar. Fiquei só assistindo do lado de fora. Também não encontraram nada.
O tempo passava, e eu olhava para o cais na esperança de avistar o caminhão das provisões, mas nada. Tudo que chegou até o momento foi óleo lubrificante para as máquinas. AAARGHH!!!
Foi então quando o Imediato novo chegou a bordo, e me perguntou: “Wei, what are you doing here?” (O que você está fazendo aqui?) Eu disse, “O Imediato me deixou de castigo, só posso sair após chegar a feira!” Ele só balançou a cabeça e entrou. Que raiva..
O tempo foi passando lentamente e nada da maldita provisão. O Comandante colocou o horário do gangway (horário de regresso) às 17h. Quando bateu meio dia, eu perguntei ao Imediato: “Vou ficar de serviço até que horas?” Ele finalmente se tocou e disse: “Tudo bem, agora você pode ir.”
Nem pensei duas vezes. Nem almocei, troquei de roupa e me mandei do porto. Na saída, o eletricista e o pintor queriam até ir comigo para a cidade, mas como o horário de regresso era às 17h, não dava tempo para eles, pois queriam fazer compras no Victoria’s Secret no shopping próximo ao porto. “Tudo bem, eu pego táxi sozinho, é o jeito”, pensei.
O motorista do taxi era colombiano, e me cobrou 40 dólares até o Liberty State Park, onde pegaria um barco até chegar na Estátua da Liberdade. Muito caro, porque se fosse no Brasil pagaria no máximo 20 reais pela distância que percorreu. Mas era a única chance que tinha para visitar a Estátua, então deixei um pouco de lado a calculadora mental. Em 20 minutos chegamos, e comprei o ingresso – 12 dólares. O barco partia às 14h, com uma parada em Ellis Island.
Ellis Island tem um museu dos Imigrantes, pois lá funcionava um posto onde se registrava todos os imigrantes que vinha de navio.
Tinha muita criança, na maioria vindo de excursão do colégio, fazendo filas para entrar no barco. Dei uma volta por lá, e quase perdi o barco para ir para a próxima ilha, Liberty Island.
A Estátua parecia muito maior visto de longe, mas tudo bem. Todo mundo me pergunta se eu subi nela, mas não. São muitos visitantes, e só os primeiros 3000 visitantes do dia podem pegar um “monument pass”, que é um ingresso especial que dá acesso ao museu na base da Estátua. Mas subir que é bom, foi proibido desde 11 de setembro de 2001.
É muito dinheiro que os donos das empresas de barco ganham, pois todo dia vão milhares de pessoas para a ilha e os barcos só andam lotados. A ilha Liberty Island fica no meio do Rio Hudson, que divide os estados New York e New Jersey. O meu navio ficava do lado de New Jersey, e Manhattan fica bem do outro lado do rio.
Pedi para uma senhora tirar uma foto minha no barco, e eu vi uma lente muito esquisita na câmera dela. Então pedi para ver como funcionava, e era muito louca mesmo! Olha só como fica a foto:
Esqueci o nome da lente, mas é bem interessante. Parecia uma sanfona, do estilo lambe-lambe e não tinha ajuste de foco, abertura nem velocidade, tudo tinha que ser feito manualmente na câmera.
Desembarquei do lado oposto de Manhattan, onde dava para ver os prédios, onde antes também tinha o World Trade Center.
Liguei para o navio e o Comandante me disse que o horário de regresso havia mudado das 17h para as 19h, então fiquei mais tranqüilo para andar pela cidade e tirar mais algumas fotos.
Vagão antigo, Liberty State Park
O lugar onde eu estava era tão remoto que tive que pegar 4 transportes até chegar ao porto. Primeiro, peguei um ônibus que levava do centro do parque até o lado de fora. Depois, peguei um “Light Rail”, uma espécie de metrô que anda nas ruas da cidade e que não tem catracas. Mas se você for pego sem bilhete, aí ou é multado ou vai pra cadeia. O Light Rail me deixou no Exchange Place, um ponto de integração onde passam todos os sistemas de transporte – Metrô, barcos e ônibus. Não entrei logo na estação de metrô, andei um pouco e tive essa vista para Manhattan:
Bonito, né? Pois é, depois disso peguei um metrô (NY-NJ PATH) que me levou até o Penn Station. Do Penn Station, peguei outro ônibus (Jersey Gardens – Hoboken) que me levou ao porto.
Foi muito corre-corre, mas valeu a pena. Cheguei no navio exatamente às 19h, e todos já estavam preocupados. O Julio já ia me ligar no orelhão quando apareci a bordo. Eu os expliquei que liguei para o Comandante e soube do novo horário de regresso, por isso voltei mais tarde.
Fiquei muito feliz, pois apesar de o Imediato atrapalhar um pouco a minha vida, consegui fazer o que eu mais queria. Foi como se fosse um sonho sendo alcançado, pois quem foi para NY e não visitou a Estátua, não foi para NY.
Agora tenho mais algumas coisas para colocar no documentário!
Até Norfolk & Savannah!
Beijos na bunda!!
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